Bebidas alcoólicas e Diabetes

Estudos na década de 90, sugeriram sugeriam que o consumo de pequenas doses de álcool poderia ser benéfico ao coração (devido à presença de resveratrol no vinho tinto)1-4, mas a Organização Mundial de Saúde (OMS) revisou os dados e destacou que os efeitos negativos do consumo de álcool estão associados à ocorrência de mais de 200 tipos de doenças e mudou sua recomendação anterior destacando que “nenhum nível de consumo de álcool é seguro no que diz respeito à saúde humana”5

Isso porque alguns estudos sugeriram que o consumo “leve” de álcool pode ter um pequeno efeito protetor no risco de doenças cardiovasculares e no diabetes tipo 26-9. Porém, são necessárias evidências científicas que demonstrem a ausência de risco aumentado para câncer a fim de identificar um nível seguro de consumo de álcool. Também, revisões sistemáticas concluíram que os potenciais efeitos protetores do consumo moderado de álcool desaparecem com o consumo episódico excessivo, o que aumenta o risco de quaisquer doenças cardiovasculares 10,11.

Em relação ao diabetes, é importante ressaltar que a ingestão de bebidas alcoólicas em jejum causa hipoglicemia porque inibe a liberação hepática da glicose devido ao bloqueio do processo hepático chamado gliconeogênese (o álcool bloqueia a captação de piruvato, oxaloacetato e glicerol-fosfato pelo hepatócito e a oxidação de lactato e glutamato pelo fígado)12. Desta forma, a ingestão de qualquer bebida alcoólica deve ser realizada junto à refeição. 

Temos de ressaltar também que o álcool interfere na ação dos antidiabéticos orais, não devendo ser consumido por pessoas que utilizam medicamentos à base de glibenclamida, biguanidas ou sulfonilureias porque estes podem acarretar em hipoglicemia grave, além de elevar o risco de acidose láctica e ocasionar taquicardia13,14.

O álcool também não é recomendado para menores de 18 anos, gestantes, lactantes5 e pessoas que também tenham diagnóstico de doenças hepáticas (como exemplo: cirrose, esteatose hepática gordurosa não alcóolica, esteatohepatite, cirrose), pancreatite, hipertrigliceridemia e/ou neuropatia diabética15,16

Enfatizamos ainda que o álcool tem calorias (1g possui 7 kcal). Assim, o consumo deve ser realizado com responsabilidade para não provocar hiperglicemia. Indivíduos que fazem o método da contagem de carboidratos devem somar os gramas de carboidratos das bebidas alcoólicas fermentadas (como exemplo: cerveja, chope, vinho, champanhe) no bolus de sua alimentação porque estas possuem quantidades significativas de carboidratos (veja a quantidade de carboidratos de cada uma delas no aplicativo de contagem de carboidratos da SBD disponível em: colocar o link: https://diabetes.org.br/app-contagem-carboidratos/). No caso das bebidas destiladas (exemplo: uísque, vodka, cachaça) as calorias são provenientes do álcool e não há carboidratos. Devido ao exposto, enfatizamos que a ingestão de bebidas alcóolicas deve ser realizadas eventualmente e com atenção por indivíduos com diabetes. 

Referencias Bibliográficas: 

  1. Blanco-Colio LM, et al. Red wine intake prevents nuclear factor-kappaB activation in peripheral blood mononuclear cells of healthy volunteers during postprandial lipemia. Circulation. 2000; 29;102(9):1020-6. 
  2. Nigdikar SV, et al. Consumption of red wine polyphenols reduces the susceptibility of low-density lipoproteins to oxidation in vivo. Am J Clin Nutr. 1998;68(2):258-65.
  3. Senault C, et al. Beneficial effects of a moderate consumption of red wine on cellular cholesterol efflux in young men. Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2000;10(2):63-9. 
  4. Rimm EB, et al. Moderate alcohol intake and lower risk of coronary heart disease: meta-analysis of effects on lipids and haemostatic factors. BMJ. 1999;319(7224):1523-8. 
  5. Anderson BO, et al. Health and cancer risks associated with low levels of alcohol consumption.  Lancet Public Health 2023;8(1): e6-e7.
  6. Ronksley PE, et al. Association of alcohol consumption with selected cardiovascular disease outcomes: a systematic review and meta-analysis. BMJ 2011; 342: d671.
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  8. Global Burden of Disease Study 2020. Alcohol Collaborators. Population-level risks of alcohol consumption by amount, geography, age, sex, and year: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2020. Lancet 2022; 400: 185–235.
  9. Roerecke M, Rehm J. Alcohol consumption, drinking patterns, and ischemic heart disease: a narrative review of meta-analyses and a systematic review and meta-analysis of the impact of heavy drinking occasions on risk for moderate drinkers. BMC Med 2014; 12: 182
  10. Rehm J, Gmel GE Sr, Gmel G, et al. The relationship between different dimensions of alcohol use and the burden of disease-an update. Addiction 2017; 112: 968–1001
  11. Roerecke M, Rehm J. Alcohol consumption, drinking patterns, and ischemic heart disease: a narrative review of meta-analyses and a systematic review and meta-analysis of the impact of heavy drinking occasions on risk for moderate drinkers. BMC Med 2014; 12: 182
  12. Siler SQ, et al. The inhibition of gluconeogenesis following alcohol in humans. Am J Physiol. 1998;275(5):E897-907. 
  13. Yamagishi H, et al. Metformin-associated Lactic Acidosis Induced by Excessive Alcohol Consumption. Intern Med. 2024;63(12):1745-1749. 
  14. Krentz AJ, Ferner RE, Bailey CJ. Comparative tolerability profiles of oral antidiabetic agents. Drug Saf. 1994;11(4):223-41. 
  15. Silva Júnior WS, et al. Doença hepática esteatótica metabólica. Diretriz Oficial da Sociedade Brasileira de Diabetes (2024).
  16. Ceni E, Mello T, Galli A. Pathogenesis of alcoholic liver disease: role of oxidative metabolism. World J Gastroenterol. 2014;20(47):17756-72.
Dra. Débora Lopes Souto
  • Nutricionista, Especialista em Nutrição Clínica pela Associação Brasileira de Nutrição (ASBRAN). 
  • Doutora em Ciências Nutricionais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
  • Mestre em Nutrição Humana pela UFRJ.
  • Pós-doutora pela Faculdade de Medicina da UFRJ 
  • Pesquisadora no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) da UFRJ
  • Membro do Departamento de Nutrição da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD)

    Instagram para COLAB: @deboralopessouto