Consumo de frutas e controle glicêmico em pessoas com diabetes: mitos e verdades   

O teor de doçura de um alimento não expressa necessariamente a sua resposta glicêmica. Um exemplo são as frutas doces que não apresentam uma resposta glicêmica elevada, enquanto outros alimentos como o pão branco, que não é doce, apresenta uma resposta glicêmica ou índice elevado glicêmico (IG) elevados. O IG de um alimento expressa o quanto este pode elevar a glicemia (glicose no sangue) em 2 horas após consumo. Em média, uma alimentação saudável inclui o consumo de 2 porções de vegetais em saladas e sopas, e 3 a 4 porções de frutas ao longo do dia, sendo uma fruta média ou 1 fatia média de uma fruta maior. As frutas são ricas substâncias antioxidantes que protegem a saúde cardiovascular e combatem os radicais livres, auxiliando contra as doenças neoplásicas.

Contudo, devemos ter cautela quando se tem o pensamento de que a fruta, por ser um alimento saudável pode consumida em grande quantidade, em uma única refeição: uma porção de fruta tem em média 15g de carboidratos, portanto, três porções de frutas terão em média 45g de carboidratos! Assim, para uma refeição completa ainda estariam faltando a proteína, o amido (cará, batata doce ou aveia, etc… e a quantidade de carboidratos poderia ultrapassar a ideal). Portanto, é recomendado que o consumo de frutas seja realizado de maneira fracionada, ao longo do dia. O horário dos lanches pode ser uma boa opção para a inclusão de fruta.

Outro aspecto que costumamos ouvir em consulta é o relato de que uma determinada fruta eleva a glicemia, sendo assim retira-se do cardápio. Quando na verdade, se uma fruta impacta mais sobre a sua glicemia, ela poderia seu utilizada em situações específicas, por exemplo, antes de alguma atividade física, e não deveria ser retirada do plano alimentar, caso seja uma fruta da sua preferência.

Algumas frutas como melancia apresenta IG elevado, mas a carga glicêmica baixa (CG). A CG é o resultado do índice glicêmico, por porção comestível do alimento. Em outras palavras, se o indivíduo consumir uma fatia média, não alteraria a glicemia, mas se o indivíduo achar que a melancia só tem água e consumir muita melancia, a glicemia irá se alterar, uma vez que ela apresenta muita glicose livre. Isso poderá acontecer com muitas frutas consumidas em excesso.

O Estudo prospectivo de investigação em nutrição, o Pan-European Study, que envolveu mais de 300.000 pessoas em diversos países da Europa objetivou avaliar se o IG e CG estão associados com o risco cardiovascular (RCV) e mostrou que a dieta com IG e CG elevados se associaram de forma robusta a um maior RCV ¹. Essa pesquisa foi publicada em 2020 e ratifica a importância da investigação nesse contexto.

Todavia, muitas vezes há uma resposta individualizada e o mesmo alimento ou fruta pode apresentar respostas glicêmicas divergentes. Geralmente um IG igual ou maior que 70, representa elevado IG e CG igual ou acima de 20 indica elevada CG ². Segue uma tabela com resultado de IG e CG de algumas frutas ³,⁴

TABELA DE IG E CG (Medidas caseiras em valores aproximados)

Para avaliar o impacto de algum alimento ou fruta na resposta individualizada sobre a glicemia, pode-se realizar o seguinte teste: após 4h sem consumo de qualquer alimento (pois se considera este período em termos metabólicos, como um período de jejum), aferir a glicemia antes da refeição (pré-prandial), consumir o alimento ou fruta que se deseja investigar e avaliar novamente a glicemia após 2h da refeição (pós-prandial). Dessa forma pode-se observar como um determinado alimento poderá afetar a sua glicemia.

Existem sucos como o de laranja que são preparados com 3 ou 4 laranjas e que apresentam em média 45g e 60g de açúcar, respectivamente. Assim, este suco poderá ser utilizado em casos de hipoglicemia! Alguns sucos, como o de manga, dependendo da quantidade de frutas utilizadas, também pode gerar esse efeito. No entanto, caso queira consumir um suco industrializado prefira somente sem adição de açúcar e evite os néctares de frutas, pois são muito ricos em açúcar. Outra estratégia é consumir a fruta in natura (quando possível, com a casca e bagaço), pois contém uma maior quantidade de fibra, se comparado ao consumo em forma de suco. 

Por fim, as sociedades científicas, incluindo a Sociedade Brasileira de Diabetes⁶, estimula o consumo de vegetais, incluindo hortaliças e legumes, frutas, grãos integrais, como alimentos do reino vegetal, que necessitam compor a alimentação de indivíduos diabéticos e não diabéticos. Outrossim, padrões alimentares com ênfase em uma baixa ingestão de alimentos ultraprocessados e maior consumo de frutas frescas e vegetais se tornam efetivos, tanto na condição de prevenção como do controle de doenças crônicas não transmissíveis, como hipertensão e diabetes.

Referências:

  1. SIERI, Sabina et al. Glycemic index, glycemic load, and risk of coronary heart disease: a pan-European cohort study. The American journal of clinical nutrition, v. 112, n. 3, p. 631-643, 2020.
  1. https://nutritotal.com.br/pro/qual-a-diferena-a-entre-a-ndice-glicaamico-e-carga-glicaamica/
  1. FOSTER-POWELL, Kaye; HOLT, Susanna HA; BRAND-MILLER, Janette C. International table of glycemic index and glycemic load values: 2002. The American journal of clinical nutrition, v. 76, n. 1, p. 5-56, 2002.
  1. ATKINSON, Fiona S. et al. International tables of glycemic index and glycemic load values 2021: a systematic review. The American journal of clinical nutrition, v. 114, n. 5, p. 1625-1632, 2021.
  1. IBGE. Pesquisa de Orçamentos familiares 2008-2009. Tabela de medidas referidas para os alimentos consumidos no Brasil. Rio de janeiro, 2011.
  1. SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES. Diretrizes da sociedade brasileira de diabetes  2019-2020. Alamedas, v. 8, n. 2, p. 178-180, 2019.
  1. DORNA, Mariana de Souza. Food Intake among the Diabetic and Non-Diabetic Elderly Population in Brazil. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 118, p. 398-399, 2022.
Amanda Araújo
Nutricionista do Departamento de Nutrição da SBD
Nutricionista do Hospital das Clínicas da UFPE
Residência em Saúde da Família pela UPE
Mestre em Políticas Públicas pela UFPE
Doutoranda em Nutrição e Saúde Pública pela UFPE
Conceição Chaves
Nutricionista do Departamento de Nutrição da SBD
Professora Associada da UFPE, Bolsista do CNPQ